A Bela e a Fera, Disney, 1991
_ Ola, Bela.
_ Bon jour, Gaston.
Gaston então toma o livro das mãos de Bela.
_ Gaston, me devolve o livro, sim?
_ Como pode ler isto? Não tem figuras.
_ Ah, só precisa usar a imaginação.
_ Bela, já é tempo de você afastar a cabeça destes livros e dar atenção a coisas mais importantes, como eu.
Gaston atira o livro na lama. Bela o apanha e limpa com o avental.
_ A aldeia toda só fala nisso. Não é direito a mulher ler. Logo começa a ter idéias, a pensar.
_ Gaston, você é um homem primitivo.
_ Obrigado, Bela.


Atendendo a pedidos de minha filha, temos representado juntos, muitas vezes, o diálogo acima, ela no papel de Bela e eu no de Gaston. Espero continuar fazendo por muitos anos e que ela aprenda com Bela a paixão pela leitura.


sábado, 29 de agosto de 2009

A Lista de Mindlin

(Extraído da Revista Veja de 25 de agosto de 2004)
O bibliófilo paulista José Mindlin recomenda estes dez livros como obras básicas para quem deseja se iniciar nos prazeres da leitura:
  1. Crime e Castigo, Fiodor Dostoievski
    Ao contar a história de um jovem que mata uma idosa para roubar e vive atormentado pela culpa, o escritor russo discute a relação entre liberdade e normas sociais.
  2. Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis
    O defunto que relembra sua vida permite ao autor brasileiro refletir sobre o vazio da existência humana.
  3. A Montanha Mágica, Thomas Mann
    Os personagens do autor alemão discutem as grandes questões do século XX _ liberdade, totalitarismoe guerra.
  4. Ensaios, Montaigne
    Misto de diário e memórias, trata de temas essenciais, como a morte e o amor, e tece o elogio da amizade.
  5. Em Busca do Tempo Perdido, Marcel Proust
    Em sete volumes, reflete sobre a doença do narrador, o tempo, a música, a literatura e o próprio ato de escrever.
  6. Dom Quixote, Miguel de Cervantes
    O herói que sonha ser cavaleiro andante é meio doido, mas não desprovido de virtudes, como coragem, independência de espírito e compaixão.
  7. Viagens de Gulliver, Jonathan Swift
    Sátira mordaz sobre a estupidez de certas convenções sociais e a mesquinharia humana.
  8. Hamlet, William Shekespeare
    A tragédia do príncipe dinamarquês contém o famoso monólogo "Ser ou não ser".
  9. Guerra e Paz, Leon Tolstoi
    O romance debruça-se sobre o impacto dos grandes eventos históricos na vida de cada homem
  10. Grande Sertão: Veredas, João Guimarães Rosa
    Em linguagem inovadora, que recria a fala sertaneja, o autor conta histórias de guerra, misticismo, amor e vingança.
Conheça a lista de 100 livros recomendados por José Mindlin.
  • As mil e uma noites
  • Bagagem (Adélia Prado)
  • Le Grand Meaulnes (Alain-Fournier)
  • A peste (Albert Camus)
  • Os três mosqueteiros (Alexandre Dumas)
  • A ilha dos pinguins (Anatole France)
  • Formação da Literatura Brasileira (Antonio Cândido)
  • Sermões (Antonio Vieira)
  • A Torre do Orgulho (Barbara Tuchman)
  • A Flor do Mal (Baudelaire)
  • Teatro (Beaumarchais)
  • Adolfo (Benjamin Constant)
  • Teatro (Bernard Shaw)
  • Decameron (Boccacio)
  • Poesia (Carlos Drummond de Andrade)
  • Poesias (Castro Alves)
  • Poesias (Cecília Meirelles)
  • Memórias (Cgiacomo Casanova)
  • Grandes Esperanças (Charles Dickens)
  • Romances e contos (Chekov)
  • O Amanuense Belmiro (Cyro dos Anjos)
  • Robinson Crusoe (Daniel Defoe)
  • Jacques, o fatalista (Diderot)
  • Crime e Castigo (Dostoiewski)
  • Os Maias (Eça de Queiroz)
  • Poesia (Elizabeth Barrett Browning)
  • Poesia (Emili Dickinson)
  • O Morro dos Ventos Uivantes (Emily Bronte)
  • O Tempo e o Vento (Érico Veríssimo)
  • Teatro (Eschyle)
  • Teatro (Eurípedes)
  • Poesia (Fernando Pessoa)
  • Tom Jones (Fielding)
  • O Processo (Franz Kafka)
  • Cem anos de Solidão (Gabriel Garcia Marquez)
  • Casa Grande e Senzala (Gilberto Freyre)
  • Romances (Gogol)
  • Poesia Completa (Gonçalves Dias)
  • Vidas Secas (Graciliano Ramos)
  • Poemas (Gregório de Mattos)
  • Grande Sertão Veredas (Guimarães Rosa)
  • Educacion Sentimental (Gustave Flaubert)
  • Contos (Guy de Maupassant)
  • Minha Vida de Menina (Helena Morley)
  • O Lobo da Estepe (Herman Hesse)
  • Odisséa/Ilíada (Homero)
  • Comédia Humana (Honoré de Balzac)
  • Orgulho e Preconceito (Jane Austen)
  • Confissões-Origem da Desigualdade (Jean Jacques Rousseau)
  • Poesia (João Cabral de Mello Neto)
  • A Morte e a Morte de Quincas Berro D´agua (Jorge Amado)
  • A Biblioteca de Babel (Jorge Luis Borges)
  • O Guarani (Jose de Alencar)
  • Menino de Engenho (Jose Lins do Rego)
  • Lord Jim (Joseph Conrad)
  • Rayuela (Julio Cortazar)
  • Contos e Novelas (La Fontaine)
  • Triste Fim de Policarpo Quaresma (Lima Barreto)
  • Os Lusíadas (Luíss de Camões)
  • Memórias Póstumas de Braz Cubas (Machado de Assis)
  • Memórias de Um Sargento de Milícias (Manoel Antonio de Almeida)
  • Gramática Expositiva do Chão (Manoel de Barros)
  • Poesia (Manuel Bandeira)
  • Em Busca do Tempo Perdido (Marcel Proust)
  • Macunaíma (Mario de Andrade)
  • Teatro (Marivaux)
  • Dom Quixote (Miguel de Cervantes)
  • Teatro (Moliere)
  • Ensaios (Montaigne)
  • Cartas Persas (Montesquieu)
  • A Carta Escarlate (Nathaniel Howthorne)
  • Poesia (Olavo Bilac)
  • Serafim Ponte Grande (Oswald de Andrade)
  • Poesias (Paul Eluar)
  • Poemas (Paul Verlaine)
  • Retrato do Brasil (Paulo Prado)
  • As Memórias (Pedro Nava)
  • Diálogos (Platão)
  • O Quinze (Rachel de Queiroz)
  • O Ateneu (Raul Pompéia)
  • Poesia (Rimbaud)
  • Raízes do Brasil (Sergio Buarque de Hollanda)
  • Teatro (Sófocles)
  • O vermelho e o negro (Stendhal)
  • Tristram Shandy (Sterne)
  • Gulliver (Swift)
  • A Montanha Mágica (Thomas Mann)
  • Guerra e Paz (Tolstoi)
  • Romances (Turguenev)
  • Conversa na Catedral (Vargas Llosa)
  • Poemas (Vicente de Carvalho)
  • Os Miseráveis (Victor Hugo)
  • Poesia (Vinicius de Moraes)
  • Eneida (Virgílio)
  • Orlando (Virginia Woolf)
  • Romances (Voltaire)
  • Teatro (William Shakespeare)

José Ephim Mindlin (São Paulo, 8 de setembro de 1914) é um advogado, empresário e bibliófilo brasileiro.
Filho do dentista Ephim Mindlin e de Fanny Mindlin, judeus nascidos em Odessa, formou-se na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Advogou por alguns anos, atividade que deixou para fundar a empresa Metal Leve, que mais tarde se tornou uma potência nacional no setor de peças para automóveis. José Mindlin deixou a empresa em 1996. Hoje, entre outras atividades, preside a Sociedade de Cultura Artística.
Após sua aposentadoria do mundo empresarial, Mindlin pôde dedicar-se integralmente a uma paixão que tem desde os treze anos de idade: colecionar livros raros. Seu primeiro livro foi Discours sur l'Histoire universelle de Jacques-Bénigne Bossuet, de 1740. Hoje, acumula um acervo de mais de 38 mil obras.
Em 20 de junho de 2006 Mindlin foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras, onde passou a ocupar a cadeira número 29, sucedendo a Josué Montello. Após saber da vitória na eleição, Mindlin declarou: "De certa forma, corôa uma vida dedicada aos livros".

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Caminhos do Coração (Luiz Gonzaga Jr. - 1982)

Caminhos do Coração

Há muito tempo que eu saí de casa
Há muito tempo que eu caí na estrada
Há muito tempo que eu estou na vida
Foi assim que eu quis e assim eu sou feliz

Principalmente por poder voltar
A todos os lugares onde já cheguei
Pois lá deixei um prato de comida
Um abraço amigo, teto prá dormir e sonhar

E aprendi que se depende sempre
De tanta, muita, diferente gente
Toda pessoa sempre é as marcas
Das lições diárias de outras tantas pessoas

E é tão bonito quando a gente entende
Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá
E é tão bonito quando a gente sente
Que nunca está sozinho por mais que pense estar

É tão bonito quando a gente pisa firme
Nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos
É tão bonito quando a gente vai à vida
Nos caminhos onde bate bem mais forte o coração

Luiz Gonzaga Jr, 1982

domingo, 16 de agosto de 2009

Sidarta / Hermann Hesse - Folha de São Paulo, 2003

Li Sidarta somente agora. Hermann Hesse o escreveu em 1922. Nos anos 60, os jovens o liam pois seria um daqueles livros que "mudariam suas vidas". Li-o talvez mais como um livro de autoajuda. Mas que bom ler um livro destes, tão bem escrito, diferentemente de seus congêneres e sucessores atuais.
Excertos do mesmo:

"_Ótimo. E qual será o bem que tu poderás oferecer? Que aprendeste? Que sabes fazer?
_ Sei pensar. Sei esperar. Sei jejuar."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.57

"Dela aprendia Sidarta que os amantes não devem separar-se após a festa do amor, sem que um parceiro sinta admiração do outro; sem que ambos sejam vencedores tanto como vencidos, de maneira que em nenhum dos dois passa surgir a sensação de enfado ou de vazio e ainda menos a impressão desagradável de terem-se maltratado mutuamente."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.58

"Certa vez, encaminhou-se a uma aldeia, a fim de adquirir ali grande quantidade de arroz. Quando chegou ao destino da viagem, soube que o arroz já fora vendido a um concorrente. Mesmo assim permaneceu vários dias naquela aldeia. Convidou camponeses a comerem e beberem. Presenteou a criançada com moedas de cobre. Participou dos festejos de um casamento e, finalmente, regressou, satisfeitíssimo. E quando Kamasvami o repreendeu pela demora do retorno e pelo desperdício de tempo e dinheiro, respondeu Sidarta:
_ Para de ralhar comigo, meu caro! Nunca ninguém conseguiu coisa alguma por meio de resmungos. Se houve prejuízo, deixa que eu arque com ele. Fico muito contente com o resultado desta viagem. Conheci muita gente. Um brâmane tornou-se meu amigo. Criancinhas cavalgaram nos meus joelhos. Camponeses mostraram-me os seus campos. Ninguém me tomou por um negociante.
_ Tudo isso é muito bonito _ exclamou Kamasvami, agastado. _ Mas, na realidade, és um negociante, acho eu! Ou fizeste essa viagem unicamente para divertir-te?
_ Claro! _ disse Sidarta, soltando uma gargalhada. _ Claro que viajei para divertir-me. Por que outra razão o teria feito? Cheguei a conhecer pessoas e regiões. Obtive gentilezas e confiança. Encontrei amizade. Olha, meu amigo, se eu fosse Kamasvami, teria regressado imediatamente, a toda a pressa, cheio de raiva, ao constatar que a compra não sairia. Nesse caso, o resultado da viagem seria de fato uma perda de tempo e dinheiro. Mas, assim, tive alguns dias amenos. Aprendi alguma coisa. Alegrei-me e não prejudiquei nem a mim nem a outras pessoas por nervosismo ou precipitação."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.60

"Nesse instante, Sidarta começava a vislumbrar o motivo por que não conseguira vencer aquele eu, nem como brâmane, nem como penitente. O que o impedira fora o excesso de erudição, de versículos sagrados, de rituais, de sacrifícios, de ascetismo, de atividades e de ambições. Sempre se pavoneara com altivez; sempre quisera ser o mais inteligente, o mais zeloso; sempre se empenhara em tomar a dianteira; sempre se exibira nos papéis de sábio, de intelectual, de filósofo. Nesse sacerdócio, nessa altivez, nessa erudição infiltrava-se o seu eu."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.83

"Entre as boas qualidades do balseiro, uma das maiores era saber escutar como mais ninguém. Sem que o outro quebrasse o seu silêncio, notava Sidarta que Vasudeva acolhia todas as suas palavras no seu íntimo, sempre se conservando atento, imóvel, receptivo, sem perder nenhuma frase, sem nunca impacientar-se."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.88

"Mas muito mais do que Vasudeva pudesse ensinar-lhe ensinava-lhe o rio. Sem cessar, Sidarta aprendia dele. Antes de mais nada, aperfeiçoava-se na arte de escutar, de prestar atenção, com o coração quieto, com a alma receptiva, aberta, sem paixão, sem desejo, sem preconceito, sem opinião."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.89

"Ao que replicou Sidarta:
_ Que poderia eu dizer-te, ó reverendo? Só, talvez, que procuras demais, que de tanta busca, não tens tempo para encontrar coisa alguma.
_ Por quê? _ perguntou Govinda.
_ Quando alguém procura muito _ explicou Sidarta _ pode facilmente acontecer que seus olhos se concentrem exclusivamente no objeto procurado e que ele fique incapaz de achar o que quer que seja, tornando-se inacessível a tudo e a qualquer coisa porque sempre só pensa naquele objeto, e porque tem uma meta, que o obceca inteiramente. Procurar significa: ter uma meta. Mas achar significa: estar livre, abrir-se a tudo, não ter meta alguma. Pode ser que tu, ó Venerável, sejas um buscador, já que, no afã de te aproximares da tua meta, não enxergas certas coisas que se encontram bem perto dos teus olhos."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.115

Este abaixo lembra-me uma frase de Luiz Gonzaga Jr. que cito frequentemente: "toda pessoa sempre é as marcas das lições diárias de tantas outras pessoas". (Caminhos do Coração)

"_Ora, meu caro amigo _ tornou Sidarta _, tu sabes muito bem que já na minha mocidade, naqueles dias que passamos na floresta, em companhia dos ascetas, cheguei a desconfiar de doutrinas e de professores, a tal ponto que lhes virei as costas. E assim me conservei. Desde então, porém, tive numerosos mestres. Uma formosa cortesã serviu-me de instrutora durante longos anos. Um comerciante abastado ministrou-me ensinamentos. Alguns jogadores de dados me deram aulas. Certa feita, um peregrino, discípulo do Buda, foi meu mestre, quando permaneceu sentado perto de mim, enquanto eu dormia na selva, por ocasião de uma romaria. Também a ele devo certas noções e lhe fico grato por isso, muito grato. Mas a maior parte do que aprendi veio-me do rio e de meu professor, o barqueiro Vasudeva. Foi um homem simples, esse Vasudeva. Nenhum filósofo. Mas sabia o necessário, tão bem quanto Gotama. Reputo -o um ser perfeito."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.116

"Mas o próprio mundo, o ser que nos rodeia e existe no nosso íntimo, não é nunca unilateral. Nenhuma criatura humana, nenhuma ação é inteiramente Sansara nem inteiramente Nirvana. Homem algum é totalmente santo ou totalmente pecador."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.117

"O pecador não se encontra no caminho do estado de Buda; não está em plena evolução, muito embora o nosso cérebro seja incapaz de imaginar as coisas de outro modo. Pelo contrário, no pecador, já se acha contido, hoje, agora mesmo, o futuro Buda. Todo o seu porvir já está presente. Tu deves respeitar na pessoa desse pecador, na tua própria pessoa, na de qualquer homem, o Buda em botão, o Buda possível, o Buda oculto. O mundo, amigo Govinda, não é imperfeito e não se encaminha lentamente rumo à perfeição. Não! A cada instante é perfeito. Todo e qualquer pecado já traz em si a graça."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.118

"Unicamente o meu consenso, a minha vontade, a minha compreensão carinhosa são necessários para que todas as coisas sejam boas, a ponto de somente me trazerem vantagens, sem nunca me prejudicarem."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.118

"Não me obrigues, porém, a falar mais. As palavras deturpam sempre o sentido arcano. Todas as coisas alteram-se logo que lhes pronunciamos o nome. Então se tornam levemente falsas e ridículas... Pois é. Mas, olha, até isso acho bem feito. Aprovo inteiramente e com o maior prazer o fato de que aquilo que para uma pessoa é um tesouro e uma grande sabedoria representa para os demais homens rematada tolice."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.119

"Não é nos seus discursos e nas suas ideias que se me depara a sua grandeza, senão unicamente nos atos e na sua vida."
Herman Hesse, Sidarta, FSP, 2003, p.121